O Fim do Jornalismo? Como a nova IA do Google Pode Silenciar a Imprensa que Informa o Mundo

O Google está reformulando a internet como a conhecemos. Com a introdução do AI Overviews, uma nova funcionalidade baseada em inteligência artificial que entrega resumos prontos diretamente nos resultados de busca, a empresa promete facilitar o acesso à informação. Mas, na prática, está colocando em risco um dos pilares da democracia: o jornalismo sério.

O funcionamento da ferramenta é simples — e, justamente por isso, preocupante. Ao pesquisar por um tema, o usuário recebe um parágrafo gerado pela IA do Google, baseado em diversos sites da web. Parece prático. O problema é que ninguém mais clica nos links abaixo, onde estão os materiais de quem realmente trabalhou, o que compromete toda a cadeia que sustenta a produção de conteúdo na internet.

Aqui é importante fazer uma distinção: existem milhares de criadores de conteúdo na internet — influenciadores, redatores de blogs, youtubers, colunistas — que produzem textos, vídeos e análises. Muitos são sérios e relevantes. Mas jornalismo profissional é outra coisa. Trata-se de um trabalho feito por repórteres, editores e redatores qualificados, que apuram, checam, confrontam fontes, trabalham com responsabilidade ética e seguem princípios editoriais.

Esse tipo de jornalismo — o que investiga corrupção, revela crimes, explica decisões políticas, ouve os dois lados e dá contexto histórico — está desaparecendo. E não por falta de importância, mas por falta de financiamento. Com a IA resumindo tudo e retendo o usuário na página de busca, os veículos jornalísticos perdem tráfego e, com ele, perdem receita publicitária. Sem leitores, não há assinantes. Sem assinantes, não há repórteres. É uma reação em cadeia.

E o mais grave é que essa crise não é nova. Desde o início dos anos 2000, os grandes jornais do mundo começaram a perder espaço e receita com o declínio das assinaturas impressas. O modelo que sustentava o jornalismo por décadas — baseado na venda de exemplares físicos e publicidade em papel — entrou em colapso com a ascensão da internet. Muitos jornais fecharam. Outros, tentaram se adaptar ao digital, mas poucos encontraram uma fórmula sustentável. Agora, com esta nova situação, a dificuldade se intensifica: mesmo o pouco tráfego que os sites jornalísticos ainda conseguiam captar está sendo drenado pelos resumos automáticos, que entregam o conteúdo sem retorno financeiro para quem o produziu.

A situação já provocou reações legais. No Canadá, uma lei aprovada em 2023 (Online News Act) obriga plataformas como o Google e o Facebook a pagar por conteúdo jornalístico. O Google inicialmente ameaçou remover notícias de seus resultados, mas acabou fechando um acordo de compensação com o governo. A discussão agora se espalha por Austrália, União Europeia e Estados Unidos, onde órgãos de imprensa exigem que gigantes da tecnologia não explorem conteúdo alheio sem remuneração.

A pergunta que precisa ser feita é direta: quem alimenta a IA do Google? De onde vêm os dados usados para compor esses resumos “inteligentes”? Em grande parte, vêm de sites jornalísticos que produzem conteúdo com credibilidade — mas que não são citados, compensados nem visitados.

Se o jornalismo desaparecer, o que restará? Um mar de informações rasas, automatizadas, recicladas entre si, com cada vez menos verificação. Nessa internet sem repórteres, ganham espaço os boatos, os vieses, as bolhas ideológicas — e perdem todos aqueles que ainda valorizam a verdade.

Inovação não pode ser desculpa para exploração. A tecnologia deve servir à sociedade, e não sufocar quem trabalha para mantê-la informada. Se quisermos preservar o direito à informação confiável, precisamos defender quem a produz com seriedade.

O jornalismo profissional não é apenas mais um tipo de conteúdo. Ele é o antídoto contra a desinformação — e está sendo apagado, uma busca por vez.

 

Manzini Anderson Tadeu

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