CRIADORES DO POSSÍVEL VI – SABER PERDER! , por Gianmarco Bisaglia

Vivendo e aprendendo a jogar, vivendo e aprendendo a jogar
Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo
Mas aprendendo a jogar…(Guilherme Arantes)

 

Um indicador consistente para avaliar a maturidade emocional de uma pessoa é conhecer  seu comportamento diante de qualquer processo de perda. Saber perder faz parte do nosso aprendizado, da construção da sensatez que aos poucos coloca nosso ego no devido lugar, e também lidar com sentimentos ruins como raiva, medo, frustração, impotência, tristeza, para que não cristalizem em nossa alma e abram caminho para as doenças do corpo físico.

O sentimento de perda é dolorido, mas podemos aprender a lidar e crescer com nossas dores:

Entender o contexto dentro da realidade das coisas, sem negação ou engano – no contexto ocidental e capitalista somos condicionados a competir para ganhar, e ninguém nos ensina como perder. É preciso reconhecer e aceitar a realidade – o carro foi roubado, sua amiga perdeu a vida, sua ideia milionária não deu certo, você não passou no vestibular. Fatos, e ponto! Mas viver ilusões como o mito do romance ideal ou casal perfeito, ou que nos julgamos melhores que os outros porque a mamãe contou, bem, aí é negar a realidade!

Assumir a co-responsabilidade colocar a culpa em alguém é confortável, mas compreender o “se” e o “quanto” contribuímos para as situações de perda nos deixa mais perto da auto compaixão e mais distantes da lamentação. Perdeu uma cliente? Pergunte-se o que você não fez por ela… a namorada te abandonou? Antes de vingar-se com postagens indevidas pense nas coisas babacas que pode ter feito! E quem perde dinheiro na roleta não tem o direito de culpar o cassino! Aqui iniciamos nosso processo de crescimento.

Chorar o tempo certo: Abel Ferreira, técnico da gloriosa Sociedade Esportiva Palmeiras, tem um adágio brilhante: “as vitórias comemoramos por 24 horas, e as derrotas lamentamos por 24 horas”. Por que? Ora pois, que a vida continua. Transformar uma derrota ou infortúnio no drama da vida pode minar nossa confiança, nos arremessar no cinismo e desconsolo. Conheci vários casos de famílias que contaminaram gerações com ressentimento por uma injustiça sofrida, uma falência, ou episódios de violência e dor. Chorar o tempo certo, ajuda. Mas mágoas passadas não criam futuros promissores.

Aprender a perder é uma arte – o boxeador Muhammad Ali desenvolveu a capacidade de apanhar – cansava seus adversários com muita movimentação e os iludia com a sensação que estavam a vencer a luta, e quando cansavam, Ali crescia e vencia, muitas vezes por nocaute. Resiliência e Estratégia. Aprendemos e praticamos isso no esporte, nos negócios, nos relacionamentos. Ceder não significa ser fraco, recuar não nos faz perdedores – times pequenos não se dão ao luxo de jogar de igual para igual com adversário superior, assim como o guerrilheiro sabe que fugir é sua única estratégia para continuar a luta amanhã.

Revanche, vingança e perdão – Uma revanche só é saudável entre adversários que se respeitam – pessoas sãs não assassinam um parente por perder uma disputada partida de canastra em família, mesmo com a tradicional, necessária e inevitável zoação! Mas quando 8 mulheres são assassinadas por dia no Brasil por seus ex-maridos/amantes/namorados compreendemos que a vingança é uma trágica parte de nossa cultura latina – imaturidade que gera cegueira e violência. Quando não cabe revanche, ou a compensação da perda significa crime, nos resta aceitar e assimilar perdas e fracassos, e se formos tocados por luz interna, parabenizar vencedores ou perdoar nossos ofensores, conforme o caso.

Maturidade e aprendizado – nos meus 20 anos, joguei num time de salão bem ruim em Diadema – perdemos uns 10 jogos seguidos, mas um dia, um empate! E a partir daí por alguns meses era bem difícil vencer a gente – equilibramos vitórias e derrotas, e curtíamos cada oportunidade de competir. Perder nunca é bom, mas pode trazer ensinamentos, evolução, mudança de atitudes e estratégias, novas escolhas e muito mais. O fracasso é um mito criado pela nossa sociedade que prega o “sucesso acima de tudo” e a ideia de que vencer pode ser “a qualquer preço”…

No esporte, para atletas profissionais, perder é só mais um dia de trabalho. Mas a derrota do time do coração gera hordas de torcedores inconformados promovendo vandalismo e agressão, infelizmente uma rotina em muitos países do mundo…mas gosto quando leio memes tipo (a gente se f**** de novo! Rir da própria desgraça pode ser pedagógico e resiliente.

Na política, a derrota pode tomar ares de tragédia grega –candidatos derrotados incitam eleitores insatisfeitos a depredarem prédios públicos, não cumprimentam adversários vencedores, ou assassinam opositores… quem não sabe perder não pode se dizer democrático, pois na democracia, assim como na vida, vencer nunca está sob nosso total controle!

Darci Ribeiro tem uma frase ótima: “tenho muito orgulho dos meus fracassos!”. Aprender a competir é compreender que a vitória é resultado de um processo e não obra do acaso, saber distinguir quando somos vítimas ou protagonistas de nossos infortúnios, e que todas experiências que vivemos, positivas ou dolorosas, moldam nosso caráter e nos preparam para batalhas maiores. Nem toda perda, por pior que seja, significa o fundo do poço, e mesmo que assim seja, podemos afundar até encontrar o solo duro, de onde podemos firmar o pé e nos lançar ao único caminho que resta: para cima!

Gianmarco Bisaglia

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