Redes Sociais: Likes, vulnerabilidades e a busca por pertencimento

Por Juliana Dorigo

Basta um passeio, um presente ou um jantar especial — e lá estão os registros nas redes sociais: as viagens, as conquistas, os detalhes mais íntimos da vida. A exposição pessoal no ambiente digital tornou-se não apenas comum, mas quase automática. Do cotidiano compartilhado em tempo real ao desfile de momentos cuidadosamente editados, parece que nada pode escapar dos stories. Somos protagonistas de uma vitrine virtual em constante atualização.

Essa prática, embora muitas vezes espontânea, traz implicações profundas sobre identidade, saúde mental, segurança e as próprias relações sociais.

A cultura da exposição

Segundo o relatório Digital 2024, da We Are Social em parceria com a Meltwater, o Brasil ocupa a 5ª posição mundial entre os países que mais passam tempo nas redes sociais, com uma média de 3 horas e 46 minutos por dia. As plataformas mais populares por aqui são: WhatsApp (169 milhões de usuários), YouTube (144 milhões), Instagram (134,6 milhões), Facebook (111,3 milhões) e TikTok (98,5 milhões) (We Are Social, 2024).

Vivemos a chamada era do eu midiático, onde os valores sociais passaram a ser muitas vezes medidos pelo número de curtidas, seguidores e visualizações. O engajamento tornou-se uma espécie de termômetro do valor individual na esfera pública.

A exposição e a saúde mental

Embora pareça inofensiva, a exposição excessiva pode gerar efeitos colaterais importantes. Um estudo da Royal Society for Public Health (RSPH), do Reino Unido, mostrou que o uso intensivo de redes sociais está diretamente relacionado ao aumento de casos de ansiedade, depressão e distorções de autoimagem, especialmente entre jovens de 14 a 24 anos (RSPH, 2023).

No Brasil, a Pesquisa TIC Kids Online (2023) revelou que 34% dos adolescentes entre 11 e 17 anos relataram sentir-se tristes ou deprimidos após comparações com outras pessoas nas redes. A curadoria da própria imagem, portanto, tem se transformado em uma armadilha emocional.

Pessoas estão adoecendo por se sentirem incapazes de atingir o padrão de “sucesso” digital exposto diariamente, muitas vezes baseado em uma realidade filtrada, idealizada e distante do cotidiano da maioria.

Privacidade e riscos reais

Outro ponto crítico é a segurança digital. Muitas pessoas, sem perceber, tornam públicas informações extremamente sensíveis: onde moram, onde estão, com quem estão, hábitos de consumo e rotinas. Essas exposições favorecem práticas como roubo de dados, golpes financeiros, clonagem de perfis e até perseguições virtuais (stalking).

A NordVPN apontou que o Brasil lidera o ranking global de vazamento de dados pessoais na internet, com mais de 47 milhões de registros expostos apenas em 2023 (NordVPN, 2024).

O paradoxo: desejo de ser visto vs. medo de ser julgado

Estar nas redes muitas vezes significa viver um dilema: queremos ser vistos, admirados, aceitos — mas tememos o julgamento, a crítica e o cancelamento. Esse paradoxo alimenta a construção de uma persona digital idealizada, que evita vulnerabilidades e só mostra aquilo que parece bem-sucedido.

Esse comportamento, frequentemente descrito como “efeito bolha”, cria uma realidade onde apenas o que é bonito, feliz e perfeito tem espaço. Nas redes, o “comercial de margarina” se torna norma, criando uma pressão insustentável por padrões inalcançáveis — especialmente entre crianças e adolescentes.

Caminhos para o equilíbrio

O objetivo aqui não é demonizar as redes sociais, mas promover uma reflexão sobre o uso consciente e equilibrado dessas plataformas. A psicóloga Ana Beatriz Barbosa Silva resume bem:

“É preciso resgatar a intimidade como valor e entender que nem tudo precisa ser compartilhado”.

As redes sociais vieram para ficar, e a exposição faz parte dessa dinâmica contemporânea. No entanto, é fundamental ponderar: até que ponto vale abrir mão da privacidade por alguns likes?

Para pais e educadores, é essencial estar atentos ao consumo digital dos jovens, orientando-os sobre os riscos e benefícios desse universo. Pensar em educação digital nas escolas é um passo urgente: ensinar crianças e adolescentes a lidarem com a internet de maneira crítica, ética e segura.

Vivemos em uma era de algoritmos e hiperconexão. E, talvez, a liberdade mais poderosa que temos hoje seja justamente a escolha do que manter em silêncio.

 

Referências:

We Are Social; Meltwater. Digital 2024: Global Overview Report. Disponível em: https://datareportal.com/reports/digital-2024-global-overview-report.

Royal Society for Public Health (RSPH). Status of Mind: Social media and young people’s mental health. Londres, 2023.

Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). Pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023. São Paulo, 2024. Disponível em: https://cetic.br.

NordVPN. Cybersecurity Report 2024. Disponível em: https://nordvpn.com/research/.

SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes Ansiosas: O medo e a ansiedade nossos de cada dia. Fontanar, 2020.

Juliana Dorigo

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