Nísia Floresta, a primeira feminista brasileira

Sua memória sobrevive contra o tempo que não é capaz de apagar o legado desta mulher tão à frente de seu tempo 

 

Dionísia Gonçalves Pinto nasceu para o mundo em 12 de outubro de 1810. Mas renasceu na vida pública com o pseudônimo de Nísia Floresta Brasileira Augusta. Precursora de ideais feministas em textos publicados em jornais e, posteriormente, em seus livros publicados, a potiguar é natural de Papari, município que hoje leva o seu nome.

Na época de Nísia, Brasil Império, a sociedade naturalizava o casamento infantil dizendo que meninas entre doze e catorze anos já estariam prontas para o matrimônio. Em 1823 ela foi forçada a se casar, com apenas treze anos de idade, com Manuel Alexandre Seabra de Melo, proprietário de terras dotado de pequeno potencial intelectual, mas este casamento durou poucos meses. Rompendo com o marido, Nísia retorna para a casa de seus pais que a receberam de volta sem muitos questionamentos, mesmo que para a época a conduta de Nísia fosse considerada transgressora e liberada.

Procurando fugir dos movimentos separatistas, a família de Nísia mudou-se para Olinda, onde o pai atuou em uma causa contra a elite local (a poderosa família Cavalcanti) e acabou, por conta desse antagonismo, assassinado em 1828. Ela tinha apenas dezessete anos de idade e descreveu a emboscada como uma armadilha dos poderosos de sua época.

No mesmo ano em que seu pai morreu, Nísia passou a namorar com um acadêmico da Faculdade de Direito de Olinda, Manuel Augusto de Faria Rocha. Mesmo que acusada de adultério pelo marido de quem havia se separado, sofrendo ameaças frequentes dele, isso não foi impedimento para que Nísia Floresta tivesse sua primeira filha com Manuel Rocha, Lívia Augusta de Faria Rocha, nascida em janeiro de 1830. No ano seguinte, nasceu seu segundo filho, que morreu precocemente pouco tempo depois.

Em pleno período imperial Nísia contestava a ideia de que a imprensa popular própria para as mulheres era escrita por homens e assim em 1831 ela começou a escrever para o Espelho das Brasileiras, jornal editado em Recife. Em cerca de 30 publicações, todas com Floresta como redatora, o periódico apontava as condições precárias das mulheres, e saía em defesa da instrução moral e cívica dos sujeitos femininos na época. Estudiosos e historiadores afirmam que o jornal foi imprescindível para a expansão de redações jornalísticas femininas por todo o Brasil.

Um ano depois de seu ingresso na redação do jornal, Nísia publicou sua obra mais consagrada, Direitos das Mulheres e Injustiças dos Homens, inspirada no livro Vindications of the Rights of Women, de Mary Wollstonecraft, precursora do feminismo na Inglaterra, escrito quarenta anos antes. O livro assinado por Nísia foi o primeiro livro no Brasil que falava sobre a instrução da mulher. Por sinal, foi a primeira publicação no país assinada por uma mulher.

Nísia abordou diferentes temáticas em sua carreira como autora literária, como abolição, direitos indígenas, sufrágio, mas sem dúvidas o tema mais discutido por ela, – e também o que mais provocou repercussão – foi a importância da educação e da emancipação feminina. Neste período, a educação era vetada às mulheres por ser considerada “desnecessária”, mas Nísia perseverou na defesa da educação como ferramenta emancipatória de libertação humana e, neste caso, feminina.

Pioneira do feminismo no Brasil, Nísia saiu à frente de seu tempo e, em 1838, fundou no Rio de Janeiro um dos primeiros colégios exclusivos para meninas, o Colégio Augusto. A legislação brasileira previa escolas femininas desde 1827, porém o ensino era limitado à educação do lar. O Colégio Augusto, fundado por ela, então, previa as mesmas aulas que os meninos recebiam, como matemática, língua portuguesa e história.

É muito difícil não fazer deste um texto biográfico porque Nísia fez tanto por nós, mulheres brasileiras… Depois de morrer na França, décadas se passaram até que seus restos mortais foram trazidos, em setembro de 1954, para o Brasil. Hoje o município com o seu nome tem como ponto de alusão histórica o túmulo cor de rosa de Nísia Floresta, eternizada no olhar de cada menina potiguar que vê um futuro melhor possível através dos feitos memoráveis da primeira feminista brasileira.

Nísia presente. Eterna na caminhada diária contra o patriarcado, lembrada através das práticas feministas e da educação libertadora contra as amarras do retrocesso. A ela, nosso reconhecimento e admiração. Retribuímos minimamente com nossa reverência e, sobretudo, com nossa luta.

 

 

Anna Luiza Calixto

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