Certa vez perguntei a uma amiga se estava namorando e ela me disse – “não, só tenho um P.A., o sexo é ótimo, não pega no meu pé, me atende quando preciso, enfim, é perfeito, a relação ideal!”.
O recém comemorado Valentine’s Day (o dia dos namorados do povo anglo-saxão) encerra um dos mais tradicionais status de casais: “o namoro”. Difícil dizer quando surgiu a convenção do namoro uma vez que por muitos séculos os casamentos eram arranjados, sendo as mulheres oferecidas como parte acessória em alguma transação política ou comercial. Inclusive nossa Imperatriz Leopoldina esposa de Dom Pedro I, foi um acordo para firmar aliança entre as monarquias portuguesa e austríaca.
Mas hoje falamos de convenções sociais e não de história! Evoluímos desde o século XIX e hoje deparamos com dezenas de possibilidades de chamar o amor da sua vida conforme o grau e a profundidade da relação. A começar pelo “Marido ou Esposa”, geralmente acompanhado pelo pronome possessivo: “Meu ou Minha” – sempre achei que a expressão carrega um enorme peso – a solidez do carimbo nem sempre atesta a felicidade do enlace amoroso… sempre achei engraçado homens apresentarem a “minha mulher”, mas raramente mulheres apresentam o consorte como “meu homem” (isso é guardado para a alcova…).
O fluxo namoro–noivado–casamento ganha novas e divertidas combinações – casados voltam a namorar, pessoas se casam sem noivar, convenções desaparecem com os tempos. E novas terminologias divertem nosso dia a dia há décadas: a “Amizade colorida” dos anos 80 (hoje se fala em “amigos com privilégios”, às vezes mais amizade que privilégios…), a “Transa”, o “Cacho”, “Rolo” (que não desenrola e nunca será linear), “Ficante” (estado permanente de não compromisso), “Peguete” (ser humano utilitário para uso casual), “Crush”… nem sei bem o que é isso!
Claro que os líricos se incomodam com estas variações pouco românticas, e ainda fantasiam a corte do namoro com aquela carga de paixão e platonismo fatalista que só os parnasianos sabem apreciar! E temos uma incrível inversão de papéis: lembra dos candidatos a namorados do passado que sofriam de taquicardia para serem apresentados oficialmente às famílias e pedir a mão da donzela? Hoje a aflição recai sobre os descasados que vão apresentar novos parceiros ou parceiras para seus filhos e filhas – “Meu Deus! Será que as crianças vão aprovar”??? Hummmmm…
Mas nem tudo desaparece por completo: “Amante” (ele ou ela) é a alcunha pesada de quem sai com o homem ou mulher alheios… uma relação escondida que só se dá plenamente (e literalmente) em alcovas e motéis obscuros, em viagens secretas e horários inventados. Quase uma arte de alta espionagem a ser praticada hoje em dia, que demanda muita preparação, habilidades de comunicação e ainda contar com a sorte de não topar com alguma câmera idiota para documentar o que os fiscais chamam de “mercadoria sem nota” e os contabilistas de “ativo a descoberto”!
Pesado também é o termo “divorciado ou divorciada” que só fica adequado nas qualificações de estado civil em cláusulas contratuais! No dia a dia, temos o “meu/minha EX” – isso diz tudo… e em tempos modernos, também surgiu uma nova categoria: EX com privilégios, embora a maioria prefere sair do casamento sem privilégios mesmo. Quem gosta de neologismos ainda se autodenomina “pós-casado(a)”, o que para mim é o mesmo que “bem-descasado”, alter ego do calórico e popular quitute. E nem vou entrar aqui na discussão do swing (antigo bacanal) ou do poliamor (versão mais elaborada do famoso ménage a trois)…
Para além das rotulações, a diferente forma de tratar nossa “cara metade” na intimidade e em público diz muito sobre a relação: “baby”, “alma”, “paixão”, “vida”, cariño, cher/cheri, dear/darling, “criatura”, ou os picantes apelidos sussurrados ao ouvido, todas se contrapõe aos papéis sociais “aceitos” pela sociedade, aos quais ainda estamos inconsolavelmente acorrentados. A verdade é que todos buscamos “um alguém” para compartilhar nossas dúvidas e mazelas do dia a dia, acolher nossos desejos de sexo, afeto e amor, mesmo com alguns tropeços e ilusões no meio do caminho. Feliz quem pode olhar nos olhos e ali reconhecer a “sua” ou “seu” companheiro!
Quanto à minha amiga do início do artigo – reencontrei outro dia e perguntei todo animado: “e aí? Como vai o PA?” Ela me olhou azeda e disse: “brochou”… nem tudo é perfeito!