A NATUREZA DO BRASILEIRO AINDA NÃO É CUIDAR DA NATUREZA. MAS HÁ DE SER.

Me lembro bem. Era uma terça-feira de 1988. Rua Dona Mariana, Bairro de Botafogo, Rio de Janeiro.

Coincidentemente, a mesma rua onde eu morava e trabalhava. Coincidência? Coincidências não existem.

Quer coisa melhor na vida? Morar e trabalhar na mesma rua?

E ainda por cima trabalhar na MPM?

Mas, particularmente naquela terça, estava inquieto e infeliz.

Frustrado talvez fosse a melhor palavra pra definir meu estado de espírito naquele dia.

Cheguei na agência logo após os almoço e ainda estava me  remoendo porque, há uma semana, o Banco do Brasil tinha recusado uma campanha.

Na verdade, o cliente tinha aprovado a campanha. Mas, na hora de aprovar o filme, ele tinha tirado o macaco.

Logo o macaco!

Explico.

Flash-back.

Eu tinha criado uma campanha institucional para o Banco do Brasil cujo conceito era proteção à natureza.

Mandei a campanha para Brasília.

O nosso pessoal da MPM de lá a apresentou ao BB.

E, na sequência, me ligaram dizendo que tinham aprovado a campanha, incluindo o filme “Árvore Sangrando”.

Mas sem a principal cena: a motosserra cortando o tronco da árvore, vertendo sangue.

Era ou não era pra ficar puto?

Fiquei uma semana zangado, querendo enfiar a motosserra na cabeça de alguém.

Não, ao contrario do que você possa pensar, não era na cabeça de nenhum atendimento.

Pois, bem.

Forward.

Voltemos àquela inenarrável terça-feira.

Cheguei logo após o almoço daquela dia, lembram?

Nem bem sentei na cadeira da sala 11 e o Diretor de Criação Fabinho Siqueira me liga, me chamando para a sala do Macedo.

Pensei cá comigo: “Meu, nunca fui na sala do Macedo, diretor da MPM, o M da MPM. O que será que os caras quem comigo?”

Fui.

Ao entrar, deparo com a seguinte cena:

Fabinho sentado na poltrona em frente à mesa do Macedão.

O Macedão, ao telefone, com aquela sua tradicional vozona grave. E a voz dele demonstrava total autoridade sobre o interlocutor.

Mais que autoridade, senti que o Macedão estava dando meio que um esporro no cara.

Até porque ele tratava o cara como “Zé”.

– “Porra Zé… que negócio é esse, Zé? Aprovaram o filme e tiraram o macaco… Quem desaprovou, Zé?… O Ministro? … Que Ministro? Porra, Zé… vamos botar esse filme no ar… mas do jeito que foi criado e editado… Porra, Zé… cê quer jogar uma idéia do caralho no lixo???”

Fiquei me perguntando: “Zé?,… Zé?… na MPM Brasilia não tem nenhum Zé. “

No Banco do Brasil, que eu me lembrasse, também não tinha nenhum Zé.

Imaginei que a MPM tinha contratado alguém recentemente pra atender a conta e que eu ainda não conhecia.

Macedo agora estava calado, ouvindo seu interlocutor.

Eu só conseguia escutar aquela barulhinho da voz do outro lado da linha… O tal Zé tentando se justificar.

Eu o Fabinho nos olhamos.

Cada um querendo dizer alguma coisa.

Meu olhar dizia que eu não tava entendendo nada.

Já o olhar do Fabinho brilhava, denunciava uma expressão de que a coisa poderia ser revertida.

E eu notei também que o Fabinho sabia com quem o Macedão tava falando. Quem seria o tal do Zé????????

Fiquei sem entender nada… animado, mas ainda sem entender nada.

Mas, na dúvida, me animei também.

Pausa. Pausa. Mais uma pausinha.

Só ouvia aquela vozinha fininha tiritando do outro lado da linha.

Aí, o vozeirão do Macedão interrompeu o Zé e deu o golpe final no interlocutor.

“- Ah Zé, então você aprova? Você banca o filme? Parabéns, acho que o Banco do Brasil nunca teve uma peça publicitária com tamanho impacto… Do caralho mesmo, Zé… E olha… fala pra aquele ministrinho plantar batata… Ele não entende um caralho de comunicação. Grande abraço, Zé. A gente se fala”.

Macedão desligou o telefone e disse pra mim e pro Fabinho:

– “Tá aprovado… porra! Toca!!!!”

Aquele “porra” no final da fala do Macedo saiu tão alto, tão definido, tão pontual, tão conclusivo, que eu fiquei com esse “porra” uma semana inteira bombando no meu ouvido.

Eu e o Fabinho saimos saltitando da sala do Macedão. Quer dizer, veja bem, quem saiu saltitando foi o Fabinho.

Eu saí feliz pra caralho, sorrindo de orelha a orelha.

Na semana sequinte, o filme foi pro ar como fora criado e editado, incluindo o macaco, ou melhor, a motosserra. Que o Enzo Barone tinha produzido, incluindo imagens que ele foi captar na Amazônia.

Colocamos no ar. E foi um fuzuê.

“Árvore Sangrando” ganhou todos, repito, todos os prêmios aqui no Brasil.

Em qual prêmio você pensou? Ganhou.

Pensou naquele outro? Ganhou.

Ah! Pensou naquele e naquele e naquele e naquele?

Ganhou, ganhou e ganhou também.

Basta pesquisar na história da propaganda brasileira. Tá lá.

E “Árvore” ainda ganhou todos os principais prêmios internacionais incluindo Ouro no Clio, Ouro no London Festival, Ouro no NY Festival.

Mas, de todas as emoções vividas com os prêmios e conquistas obtidos por este filme, a maior de todas, sem dúvida, foi quando ele concorreu no Festival de Cannes 1989.

Domingo, após o Festival, fui descansar 10 dias em Paris.

E, na segunda-feira, estava no hotel, vendo um programa jornalístico na TV.

Aí, entrou uma matéria sobre o Festival de Cannes, falando sobre os trabalhos premiados, sobre as novidades, as surpresas e também sobre algumas peças que agradaram ao público mas que não tinham sido premiadas.

E… surpresa… mostraram “Arvore Sangrando”!!! Como exemplo de filme criativo, bem produzido, oportuno pelo tema natureza.

Tomei um susto. Saltei da cama. Não quis acreditar.

Mas tava lá oui, monsieur.

Meu filme tava lá, na TV1 da França!!!!!

Chorei, solucei como um bebê.

Naquele exato instante, muitas coisas vieram ao mesmo tempo em minha mente. Um turbilhão de boas memórias, um porrilhão de coisas boas da minha vida.

Lembrei da minha esposa, meus filhos, meus pais, meu sogro e minha sogra, meu papagaio, lembrei até do meu Palmeiras!

E lembrei da MPM. A minha MPM.

E tudo isso aconteceu graças àquele “Zé” que tava do outro lado da linha do Macedão.

Por isso, quero terminar este artigo agradecendo.

Obrigado, MPM.

E, claro, obrigado, Zé Sarney. Que era o Zé, presidente da República naquele momento.

 

 

Veja o filme “Árvore Sangrando” neste link.

 

 

 

 

 

 

Wanderley Dóro

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