Cuba, o paredão e as verdades que ninguém te conta

Cresci na ditadura causada pelo golpe militar de 1964. O golpe patrocinado pelos EUA, que segundo diziam, era o paraíso e ao contrário de Cuba, a terra do diabo, não existia pobreza. Todo mundo tinha comida, moradia, estudos e saúde, o melhor lugar do mundo, ao contrário, é claro, de Cuba, onde todos morriam de fome e quando reclamavam iam para o paredão, onde Fidel passava dias inteiros fuzilando pobres famintos entre baforados de charutos e copos de rum.
Demorou um tempo até que eu começasse a perceber onde realmente morava o tal diabo. Quem eram os verdadeiros assassinos, onde se passava fome, onde a saúde dependia de muito dinheiro e a segurança pessoal não existia.
Já estávamos nos anos de 1970, quando um professor de geografia, que falava de tudo, começou a nos ensinar as diferenças entre o socialismo e o capitalismo e nessa época comecei a me interessar pela política. As informações sobre Cuba e União Soviética ainda eram produzidas pela propaganda norte-americana e é claro, com fotografias onde o comunismo era representado por uma velha de bigode ralo com cara de bulldog, uma sacola vazia na mão esquerda e um filão de pão — que era um por semana — embaixo do braço direito. Essa imagem criada pelo marketing anticomunista também nos passava a ideia de quanto nossos generais entreguistas eram bons ao terem evitado que nosso país tivesse que passar por isso. Pelo menos eles imaginavam que todos eram idiotas por igual. A ignorância assim como a pobreza poderiam ser socializadas junto com o medo!
Foi somente em 1976, quando eu já cursava o primeiro ano da faculdade de psicologia, que Fernando Moraes lançou seu livro “A Ilha” sobre Cuba, o país até então desconhecido pela maioria de minha geração.
Nessa época, principalmente a partir de 1970, enquanto brasileiros movidos pela propaganda golpista de 1964 demonizavam Cuba, o governo militar torturava crianças de um ano e meio com choques elétricos, como foi o caso de Carlos Alexandre Azevedo, que nunca se recuperou e acabou se suicidando quando adulto, estupravam meninas bonitas sob a alegação de serem militantes de esquerda, ainda que nunca tenham sido nada, enforcavam jornalistas e davam sumiço em corpos de deputados interrogados nos porões do Departamento de Ordem Política e Social. E esse era o país perfeito, democrático e humano para a maior parte de brasileiros ignorantes e subservientes.
O que era Cuba antes da revolução? Cuba era quintal dos EUA, quartel da Máfia, ponto de encontro de estadunidenses a busca de prostituição, meninas e meninos de 12 anos e um grande salão de jogos. Seu povo não tinha residências dignas, estudos, o sistema de saúde era inexistente para pobres e o trabalho precarizado.
O que é Cuba hoje para o capitalismo? Um péssimo exemplo. Onde não existe seguro saúde, onde médicos são gratuitos, onde a maioria do povo pode ter ensino universitário, não existem moradores de ruas, consumo de drogas, não há jogos, não há armas, só para resumir. Imaginem o prejuízo que uma sociedade assim pode gerar num sistema capitalista, como nos EUA.
Em Cuba eu lia jornais todos os dias. Não existiam roubos, assaltos, assassinatos. Fiquei amigo de um matador de mosquitos. 30 horas de trabalhos semanais e o resto passava com os filhos. Também conversei muito com um membro da Seita Vudu. “Nunca tivemos repressão religiosa, sou artesão e vivo do meu trabalho”, dizia ele.
Me disseram que Cuba não tinha internet, ou que vários sites eram censurados. Internet normal, você compra um cartão, tipo raspadinha e não há censura, inclusive existem dezenas de blogueiros que fazem criticas pontuais ao governo. Ao governo, não ao sistema.
Porque muitos cubanos se arrisca para fugir de barco até Miami?

E o “paredão”?

Mas só tem um partido?

Resumindo vou usar palavras do grande amigo Gilberto Santana:
Na esteira das visões estereotipadas da ideia de paraíso ou inferno está um país, que em 1959 rompeu com seu passado colonizado e abriu definitivamente as portas de uma nova época. Desde então, ocorreram avanços sociais, jamais imaginados para um lugar conhecido como quintal dos EUA e, fonte de intenso turismo sexual nos idos do século passado.
Entre erros e acertos, o trabalho coletivo forjou amplas condições de existência para o seu povo em meio a um bloqueio econômico, cláusula pétrea para o fortalecimento do imperialismo e a defenestração do socialismo, colocado pela grande mídia ao mundo como “ditadura”, sendo que o capitalismo passa a ser considerado como o grande sistema. Nele, a imprensa e os monopólios controlam nossas vidas, mas aqui não se trata de maneira alguma de uma espécie de ditadura, só um modo característico de ditar os caminhos da nossa irrelevância perante o modus operandi.

Antonio Sonsin

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