Desde cedo aprendemos a importância de saber nos portar. É uma regra básica de convivência: respeitar o espaço do outro, ajustar o tom de voz, escolher as palavras de acordo com a situação. Isso é saudável e necessário, afinal, viver em sociedade exige cuidado e respeito. Não falamos com um chefe da mesma forma que falamos com um amigo íntimo, nem entramos em uma reunião como chegamos em uma festa de família. Esses ajustes fazem parte da vida e não há nada de errado nisso.
O problema surge quando esses ajustes deixam de ser naturais e começam a exigir que a gente crie personagens. Quantas versões de si mesma você veste em um único dia? A versão competente e sempre disponível no trabalho, a compreensiva dentro de casa, a divertida no grupo de amigos, a impecável nas redes sociais. Aos poucos, não são mais nuances, mas personagens inteiros criados para caber em cada lugar.
E esse esforço cobra um preço alto. O desgaste emocional aparece, a sensação de vazio aumenta e a identidade começa a se perder. É como usar sapatos apertados todos os dias: você até consegue caminhar, mas cada passo causa incômodo, e no fim do dia a dor pode ser insuportável.
Existe uma diferença enorme entre saber se portar e precisar se transformar em outra pessoa. O primeiro é sinal de maturidade e respeito; o segundo é sufocante e nos distancia da nossa essência. Há uma linha fina entre adaptação e deformação, entre respeitar os outros e se apagar.
A verdade é que não precisamos caber em todos os lugares.
Mesmo que o discurso social insista que devemos agradáveis e adaptáveis em qualquer cenário, a liberdade está em ser flexível, mas sem sufocar.
Ambientes onde nossa versão mais honesta pode simplesmente existir são essenciais. Ambientes onde não é preciso fingir, encolher ou ensaiar cada gesto para ser aceito.
Saber se portar abre portas, mas sustentar personagens demais pode causar adoecimento emocional.
A vida não é sobre caber em todos os lugares. É sobre encontrar os lugares onde você pode respirar sem medo de se perder de si mesma.
Seja gentil com você, sempre!