UM JECA FELIZ NO ÚRTIMO.

Morei em 7 cidades diferentes, em três estados diferentes, em dois países diferentes.

Nasci em Ibitinga, Interior de SP, onde morei até os meus 18 anos.

Depois, morei 10 anos em Ribeirão Preto, 1 ano em Nova York, 7 anos em Salvador, 1 ano em Recife, 7 anos no Rio e há 29 estou em São Paulo.

Portanto, posso dizer que tenho uma certa experiência em cidades.

Todas as cidades têm sua diversidade, com características diferentes, cores diferentes, sons diferentes, texturas diferentes.

Todas têm coisas muito legais e outras nem tanto.

Mas quando você vive um tempo nelas, você automaticamente vai aprendendo a viver e conviver com o bom e o mau, com a beleza e a feiúra, com o silêncio e o barulho.

Todas as cidades onde morei têm uma característica comum: são lindas, grandes ou pequenas, com a natureza exuberante a lhe beijar todos os dias.

Aprendi a amar cada uma delas. Do seu jeito, juntando com o meu jeito.

Especificamente em São Paulo, aprendi a ser generoso por uma cidade absolutamente generosa comigo.

Uma cidade que acolheu milhares de imigrantes e migrantes de todas as partes do mundo.

Que acolheu meus avós italianos que vieram fugidos da Guerra, passaram 6 meses no navio vendo gente morrendo e sendo atirada ao mar, e como milhares de imigrantes e migrantes fizeram sua vida na cidade. E eles nos deixaram um legado, uma herança, difícil de avaliar em números. Até porque, aprendi também, que uma grande herança não se avalia em números. Mas em educação, amor, carinho e respeito ao próximo.

No caso específico de São Paulo, aprendi tudo de uma vez. Porque você vive a beleza e a feiúra da cidade junto com a facilidade e a dificuldade de viver na cidade.

São Paulo proporciona muito mais do que shoppings maravilhosos, restaurantes sofisticados e coisas quetais.

Ela lhe ensina a conviver e a respeitar o próximo.

Como? Ouvindo o próximo, dialogando com ele, como um vizinho que mora ao lado ou mesmo com alguém que você conheceu no estádio do seu time e que depois nunca mais viu. Mas, naquele instante mágico, você sente profundamente o significado da palavra convivência. Mesmo que em poucas horas ou poucos minutos.

Nessa semana conheci um garçon venezuelano que, em menos de um minuto me relatou os sofrimentos por que passa a sua família. E nem precisava de palavras para me dizer. Bastava ver e ler o seu semblante, sua voz embargada. Durante mísero um minuto me coloquei no lugar dele e pensei em imediatamente em meus avós.

São Paulo é assim.

Múltipla.

Generosa.

Acolhe a todos sem distinção.

Me ensinou, também, que você não precisa de coisas chics e elegantes para ser feliz.

Que você pode sentir as mesmas emoções comendo um sanduba de mortadela na padoca ou uma refeição no restaurante mais chic da França.

E sabe por que?

Porque você descobre que, para ter essas sensações, você tem que estar desprovido de vaidades. Ao contrário, deve estar cercado de amigos, onde estiverem. Não importam se seus amigos/vizinhos sejam jecas ou não.

Pode ser um amigo venezuelano que você conviveu durante 1 minuto e talvez nunca mais vá ver.

Ou pode ser um amigo/vizinho que você conviveu zilhões e anos com você e sua família.

Eu me considero um jeca feliz.

Um jeca que conheceu (e continua conhecendo) o mundo mas que não perdeu as raízes, não perdeu a humildade e não perdeu a mania de fazer sempre novos amigos.

Foi em São Paulo que ganhei meu neto Bernardo.

Certamente Bernardo vai dizer “ôrrameu”, vai comer em muitas “padocas”, vai cruzar com muitos “marronzinhos” no trânsito. E que tudo vai chegar como música aos meus ouvidos. Porque vai me fazer lembrar, todos os dias, de meus avós, que aprenderam a falar português misturado com italiano, mas que nunca se esqueceram de agradecer a terra que os acolheu.

Por último, a coisa mais importante de todas que a acolhedora e generosa São Paulo que me ensinou: não cuspir no prato em que comeu e, principalmente, no prato em que está comendo.

 

 

Wanderley Dóro

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