Bragança Paulista carrega, desde 28 de outubro de 1964, o título de estância climática concedido pelo Governo do Estado de São Paulo. Essa designação não é apenas simbólica, ela dá direito a repasses anuais do Departamento de Apoio ao Desenvolvimento dos Municípios Turísticos (DADETUR), canalizados via Secretaria de Turismo e Viagens do Estado. Em 2023 por exemplo a cidade captou R$ 7,2 milhões para a revitalização do Parque Linear do Rio Jaguari, apelidado de “Praça da Música”, com contrapartida municipal de cerca de R$ 333 mil.
Esse dinheiro funciona como investimento multiplicador, cada real aplicado em infraestrutura turística deverá retornar em mais empregos no setor de serviços, maior arrecadação indireta e fortalecimento da imagem da cidade.
Segundo dados do IBGE, o PIB de Bragança em 2021 foi de R$ 7,95 bilhões, um crescimento de 14,7% em relação a 2020. O PIB per capita chegou a R$ 46.153. Na composição, Serviços respondem por mais de 60% da economia local, seguidos pela Indústria e pelo Agro. Essa estrutura é comum a cidades médias com função regional: o setor terciário sustenta emprego, renda e circulação de consumo.
É exatamente aqui que o turismo se encaixa. Eventos, esportes, gastronomia e cultura geram efeitos diretos (gasto do visitante em hospedagem, alimentação, transporte), indiretos (fornecedores que abastecem hotéis, restaurantes, organizadores) e induzidos (salários pagos que voltam em consumo local).
Há quem insista em dizer que Bragança deve escolher entre ser uma cidade industrial ou turística. Esse raciocínio é equivocado. Não existe escolha entre indústria e turismo: os dois setores são complementares e podem se desenvolver de forma integrada.
Do ponto de vista acadêmico, a indústria atua como motor de produtividade e inovação, enquanto o turismo fortalece os serviços e absorve mão de obra. Algumas cidades provam que é possível manter base industrial sólida e, ao mesmo tempo, consolidar-se como destino turístico e cultural.
Em Bragança, isso é ainda mais evidente. Os recursos de turismo vêm carimbados do Estado e não competem com políticas de industrialização. Pelo contrário, podem ser integrados: o trabalhador da indústria também consome lazer e eventos; o visitante turístico também gera demanda industrial e logística. A narrativa de que “turismo substitui indústria” é um mito que enfraquece o planejamento.
A Expoagro é a prova de que Bragança sabe atrair público, um exemplo claro de como um evento pode movimentar a economia local. A rede hoteleira registra aumentos de ocupação, o transporte por aplicativo aumenta, ambulantes e comerciantes informais ganham renda extra. No entanto, a cidade ainda não produz relatórios oficiais de impacto, quantos visitantes pernoitaram? Qual o gasto médio por turista? Quanto isso representou em impostos adicionais? Sem esse tipo de medição, o ganho se perde em percepções.
Do ponto de vista acadêmico, um simples survey de impacto econômico junto ao público poderia oferecer dados para análise: perfil socioeconômico, origem, gastos, permanência. Isso permitiria calcular o multiplicador de renda real da Expoagro em Bragança.
Se a Expoagro é o motor sazonal, o Red Bull Bragantino é o motor contínuo. Desde que foi incorporado pelo grupo austríaco em 2019, o clube passou de um time de médio porte a uma potência nacional, colocando o clube como 12º clube mais valioso do Brasil.
O impacto econômico direto aparece nos dias de jogo: bares, hotéis, transporte e ambulantes lucram com o fluxo de torcedores. O impacto indireto é ainda maior: Bragança aparece semanalmente em transmissões nacionais e internacionais, fortalecendo sua marca territorial.
Em 2024, a Prefeitura registrou R$ 1,087 bilhão em receitas brutas realizadas e R$ 1,113 bilhão em despesas empenhadas. Em contextos de orçamento apertado, os recursos do turismo se tornam ainda mais valiosos: por serem carimbados, não competem diretamente com saúde ou educação, e podem aliviar a pressão sobre áreas como infraestrutura urbana, manutenção de praças e promoção cultural.
O problema é que faltam métricas de avaliação. Cidades estância bem-sucedidas produzem inventários anuais de oferta turística (quantidade de leitos, ocupação média, diária média, permanência, ticket médio do visitante) e calendários estáveis de eventos, capazes de distribuir a demanda ao longo do ano. Bragança, até hoje, carece desses instrumentos.
Hoje, Bragança já mostra que atrai público quando se organiza. A Expoagro concentra quase 180 mil visitantes em uma semana. O Red Bull Bragantino coloca a cidade em rede nacional todos os finais de semana. A gastronomia (linguiça artesanal, cervejarias), o clima e a localização (a apenas 89 km de São Paulo) são diferenciais claros.
O que falta é transformar ativos dispersos em política integrada. O título de estância climática não pode ser apenas uma placa na entrada da cidade, precisa ser um instrumento de política econômica. É preciso articular o turismo cultural, o turismo esportivo e o turismo gastronômico em uma estratégia comum, com métricas claras de retorno.
E, acima de tudo, é preciso superar o mito do trade-off. Bragança não precisa escolher entre indústria e turismo. Pode fortalecer os dois ao mesmo tempo. O verdadeiro risco não é dividir esforços, mas insistir na falsa ideia de que apostar em um inviabiliza o outro.
Bragança já tem todos os ingredientes: recursos estaduais via DADETUR, eventos que atraem centenas de milhares de pessoas, um clube de futebol bilionário, gastronomia reconhecida e um setor de serviços robusto. O que falta é o elo mais importante, planejamento com base em dados.