Criadores do Possível VIII – “Comportamentos Inconscientes”, por Gianmarco Bisaglia

Quem de dentro de si não sai, vai morrer sem amar ninguém.

(Vinícius de Moraes, em “Berimbau”)

 

Muitas vezes nos surpreendemos com o comportamento das pessoas que interagem conosco. Podem ser familiares, amigos ou estranhos, cujas atitudes e reações nos trazem a reflexão: por que ele/ela se comportou daquela forma?

Antes de fazer julgamentos sobre o estado de espírito ou o caráter da pessoa com base em seus atos, falas e posturas, é preciso compreender uma questão mais profunda envolvida  – são os “comportamentos inconscientes”, ou simplificando – processos que ocorrem sem intervenção da consciência. É quando agimos ou reagimos sem nos darmos conta, produzindo comportamentos de controle, defesa, submissão, confronto, encantamento, sedução e outros.

Todas as nossas memórias e experiências do passado são registradas pelo inconsciente – ali se abrigam nossas pulsões e desejos, recalques, medos e traumas. Nossa mente pode produzir diversos mecanismos de defesa que protegem nosso ego – o comportamento inconsciente está associado a este perfil de atos adotados sem que tenhamos domínio ou conhecimento deles. De certa forma proporcionam equilíbrio necessário para o indivíduo em suas interações sociais, por exemplo, se uma criança foi ridicularizada em público, e ter desenvolvido recalque com a experiência, pode numa fase adulta adotar uma postura de negação: “não sei falar em público…” ou algo parecido.

Assisti uma vez grande amigo realizar uma palestra sobre autoajuda – ele estava em transição de carreira e promovia seu livro sobre comportamentos assertivos – em dado momento foi mostrar o livro e não achou o exemplar – virou-se para seu secretário e rispidamente perguntou onde estava o livro – caiu ali sua máscara de coaching assertivo e surgiu inconscientemente o soberbo autoritário.

Claro que um comportamento não racionalizado também pode ter origem na simples falta de leitura de cenário, ou na falta de empatia e percepção sobre nosso interlocutor, levando a falas ou atitudes inadequadas para o momento. Gafes são essencialmente isso! Falta de percepção…

Obviamente não é simples identificar em nós próprios estes comportamentos, e mais desafiador, trazer para o plano consciente a administração de recorrentes reações; às vezes temos que investigar melhor as causas, descobrir um pouco mais sobre nós, perceber a forma e o porquê falamos e reagimos – podem ser comportamentos aprendidos na infância imitando nossos pais ou avós, ou replicação de atitudes ou falas de nossos melhores amigos, ídolos ou professores. Meu amigo Raul um dia me contou que quando falava com sua namorada, percebia-se replicando as mesmas falas de seu pai com sua mãe, e me dizia: “o pior é que detesto o jeito que meu pai fala com minha mãe”…

Mas quando o espelho não é suficiente para mostrar-nos a realidade, precisamos de feedback sincero e amoroso (só amoroso ou só sincero não atende!!!!). Os outros conseguem enxergar as mazelas que inconscientemente trazemos aos palcos da vida, e podem nos iluminar com suas opiniões. Conhecendo nosso comportamento inconsciente (oculto para nós, mas percebido pelos outros), ampliamos nosso espaço de interação saudável, reduzindo nosso campo desconhecido, onde moram todos nossos fantasmas e demônios… é a proposta da “janela da Johari”, uma prática que nos ajuda a visualizar os campos de interação social.

Paulo Freire pontua que nossa inteligência aumenta na proporção de nossas interações sociais – dar e receber feedback é irriga o processo. Mas nem sempre é simples a desconstrução de um comportamento automatizado, ou nem sempre as pessoas estão prontas para lidar com o feedback, por mais bem intencionado que seja; as defesas são ativadas e escutamos o clássico “a vida é minha, o problema é meu, sou assim mesmo, quem quiser que me aceite…”, e outros autoenganos compreensíveis.

Estamos sempre com o papel pregado às costas, e só vamos saber o que está escrito fazendo perguntas aos outros – isso é passar de nível no plano do autoconhecimento.

Então, não julgar o outro(a) é um bom ponto de partida para ajudá-lo(a)! Quando ambos expressam conscientemente suas diferentes percepções podemos exercitar o saudável conflito dialógico, intenso, democrático e assertivo. O comportamento consciente é a própria racionalidade humana!

Mas se a comunicação e o relacionamento ficam estagnados, comportamentos inconscientes podem ter sido ativados gerando barreiras invisíveis, que só conseguiremos transpor com empatia, compaixão, afeto e feedbacks sinceros. Fica aí o desafio! Boa sorte!!!!

 

Microconto bônus:  “Sem máscara”

Mirei minha face e senti minha pele, insuportável nudez…

Gianmarco Bisaglia

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One thought on “Criadores do Possível VIII – “Comportamentos Inconscientes”, por Gianmarco Bisaglia

  1. Angela 27 de agosto de 2024 at 09:17

    Tipo de roupa que veste feito uma luva👏🏿👏🏿👏🏿

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