CRIADORES DO POSSÍVEL V – A CRIANÇA EM NÓS, por Gianmarco Bisaglia

 

Vai vai vai começar a brincadeira, tem charanga tocando a noite inteira,

Vem vem vem, ver o circo de verdade, tem tem tem, brincadeira e qualidade!

(Sidney Miller)

 

Recém chegado de uma viagem a Santa Catarina com minha família, quero dividir as emoções do adulto que se permite viver o mundo infanto-juvenil – brincar, simular, manifestar a criança que nunca saiu de nós, sem culpa e sem retoques! Um jogo onde o prêmio é transgredir o mundo pronto e organizado, com ética, prazer e muita alegria.

Perdidos entre as múltiplas funções sociais que nos cabem enquanto adultos, somos muitas vezes “lembrados” por nossos instintos a nos desprendermos da realidade e consciente ou inconscientemente praticarmos a forma mais primitiva das manifestações da natureza – o brincar! Somos seres lúdicos, brincamos e jogamos desde a tenra idade, de forma espontânea, sozinhos, em grupo, com animais, com objetos, fazemos de jogo uma forma de descobrir limites e testar habilidades, de aliviar tarefas árduas ou simplesmente exercer nossa liberdade.

O brincar é “uma atividade imaginária, que corresponde a uma das noções mais primitivas e profundamente enraizadas em toda realidade humana” (Huizinga em Homo Ludens) – a partir do jogo, nasce a cultura e seus rituais expressos na linguagem, nas artes, no trabalho, nas religiões, nas guerras, no lazer, na política, no convívio social e relações familiares.

O brincar transcende nossa capacidade cognitiva – o bebê de poucos meses, ainda sem domínio da linguagem, brinca de “esconder” atrás de um pano, rindo muito disso! Cães e gatos brincam um jogo de luta, simulando ferocidade, ataque e defesa, sem, no entanto, se machucarem mutuamente. E o que falar dos jogos de acasalamento de diversas espécies? Primitivo e espontâneo, o desejo de brincar nos energiza, entusiasma e nos mergulha na humanidade de nossa própria espécie.

O brincar tem regras, expressas ou não, pactuadas ou não, possui a alternância de “tensão-distensão”, uma disputa desafiadora, que resulta em castigo ou recompensa. Quando amassamos a bolinha de papel e simulamos um arremesso no cesto, somos Michael Jordan! Ou apostamos conosco mesmo se conseguimos virar uma panqueca sem demandar uma faxina extra na cozinha…

Mesmo dentro do trabalho, função social absolutamente adulta, podemos transgredir e criar competições saudáveis, para atingir metas, solucionar problemas, criar coisas novas, reduzir prazos, desconstruir inutilidades – a interação profissional nesses casos, deixa de ser rígida e compartilhamos desafios, podendo celebrar as vitórias ou rir dos fracassos. Bom , é claro que se a coisa descamba para a competição explícita, desaparece o lúdico, que possui raiz na espontaneidade e no prazer – os jogos corporativos são mais vorazes!

E o que divertidamente dizer das emoções relacionadas ao jogo ? Medo, culpa, raiva, alegria, ansiedade, orgulho, compaixão, que se conectam aos nossos movimentos corporais, despertam nossos sentidos que fornecer as informações com as quais tomamos decisões e agimos – uma dança complexa que já sabemos antes de nascer!

Costumo dizer sobre a maturidade emocional, que não somos “adultos” por aprendermos a controlar as nossas emoções, mas porque podemos escolher (e termos consciência) de qual idade viver em cada ocasião – quando jogo futebol com amigos, temos todos 10 anos de idade! Quando eu subo ao palco com minha banda, sou o adolescente buscando reconhecimento! Se nos permitimos esta liberdade lúdica, mesmo nas coisas “sérias” que fazemos, colocamos leveza e significado em nossas vidas, aumentando prazerosamente nosso estoque de vivências e conhecimento, as matérias-primas da sabedoria.

Então, “bora” subir na roda gigante, pular corda, apostar corrida com nossos filhos, “brincar” seriamente em nosso trabalho, colocando a dimensão de prazer e desafio em tudo, xingando muito nas derrotas que modelam nosso orgulho, e esquecendo a tristeza numa guerra de travesseiros ou na adrenalina de uma montanha-russa.

Que a vida é coisa séria demais para levarmos sem brincar!

Gianmarco Bisaglia

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One thought on “CRIADORES DO POSSÍVEL V – A CRIANÇA EM NÓS, por Gianmarco Bisaglia

  1. João Paulo 16 de julho de 2024 at 15:29

    Tá de brincadeira??? rs… Gostei…

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