Como eu já disse, sempre escrevi. Escrevo mal, preciso de revisor, sou desatencioso,
nunca fui bom em gramática, sou preguiçoso e se tiver que ler o que escrevi, mudo tudo,
então não leio. Mas ainda assim, em 2003 resolvi viver de escrever, num país de ignorantes,
onde existem mais academias de musculatura cerebral, que academias de letras e bibliotecas,
onde existem mais igrejas que escolas.
O Brasil é um país ímpar, quase ninguém conheceu ou leu Plínio Marcos, mas
conhecem Zezé de Camargo, um perfeito ignorante. Não para por aí, isso vai longe. Não
acredito que mais de 3% da população já leu um livro, talvez nem a bula do Rivotril que
consomem. É cada vez mais difícil conversar com um capacho social, eles não entendem nada
e nem querem entender. Aquela merda de vida que levam está de bom tamanho. Alguns leem
versículos de bíblia, mas sem capacidade de entender, outros, uma ou outra noticia de seus
times. Tenho visto um crescimento na desinformação desde a década de 80, claro, pode ser
anterior, mas foi quando comecei a perceber.
Hoje a inteligência artificial escreve um livro em poucos minutos, acho providencial,
ela pode substituir a ignorância natural de 80% de nossa população.
Apesar de tudo, nos últimos 21 anos, de 2003 a 2024 escrevi 31 livros (biografias, livros
para terceiros, romances, romances históricos, histórias de cidades e ficção cientifica), que são
até legaizinhos, mas exceto ficção cientifica, qualquer um poderia escrever. As histórias
sempre se repetem, as guerras são sempre pelos mesmos motivos, mudam apenas as
tecnologias, as histórias pessoais, que geram bons romances, são sempre aquelas onde alguém
se ferra. Ninguém lê histórias de gente certinha, que sempre se deu bem. As biografias são
narrativas de fatos passados, então, não há nada de especial, exceto, como já disse, ficção
cientifica.
A ficção científica requer estudos, pesquisas, conhecimento de evolução tecnológica,
criatividade e lógica. Em Akanis, minha primeira ficção cientifica, os telefones são invisíveis,
feitos de teias grafeno lançadas há poucos centímetros da visão, a partir de informações de um
chip implantado no cérebro. Para escrever sobre isso, que pode ou não se confirmar, o autor
precisa ler, pesquisar e entender. As pessoas nessa história vivem até 200 anos com pouco
envelhecimento do tecido, ou seja, pesquisar muito sobre a ligações de carbono, como se
procede o envelhecimento e como retarda-lo. Já em Aztlan, tive que estudar Einstein,
relatividade e lapsos do tempo. Não é difícil. Necessário para descrever uma viagem no tempo.Em Akahin, a história acontece após um grupo de jovens receberem superpoderes com a
implantação de chips, que ativam partes especiais do cérebro.
Isso tudo foi apenas para mostrar o poder de conhecimento que podemos somar ao
pesquisar para escrever, ou simplesmente ler, se quisermos realmente entender. É esse ponto
que desejo levantar. Muitos até conseguem ler alguma coisa, mas poucos entendem.
Não culpem as escolas, nem os professores, eles também não sabem. Não digam que a
escola piorou, por isso o povo é ignorante. Em 1969, auge da ditadura militar, resto do único
projeto educacional, logo abolido pelos militares e considerado o melhor, eu lia por obrigação.
O professor mandava ler escritores do século XIX, que eu não entendia nem a linguagem e
nem eles, pois não explicavam. Nunca aprendi química, física e matemática, apenas decorava
para passar de ano. Esse é o ensino capitalista, passar o tempo fazendo de conta que aprende,
até se tornar apto a ser mão de obra para o sistema. Como nas escolas militares, muito em
moda hoje, que servem apenas para gerar eunucos doceis, ou seja, trabalhadores
comportados.
Esses seres autômatos trabalham ou estudam, depois vão para academia, igreja e
completam o ciclo em casa. São mantenedores das grandes riquezas, endividados com o sonho
do carro novo e uma família nos mesmos moldes para a continuidade do ciclo.
Esse é o tipo de gente que acredita na mamadeira de piroca, banheiro coletivo, gente
treinada para ser ignorante e gerar ignorantes. É gente que curte música de corno, que
incentiva bebedeira, bater na mulher que traiu e levar vantagem em bostas.
Voltando aos livros, existe atualmente um apoio a ignorantização da população e está
dando resultados, uma das premissas é exatamente a demonização da intelectualidade,
aversão a arte, desconhecimento da história, repudio a filmes de qualidade e culto a mentira.
A cultura sendo substituída pela ignorância, onde todos se igualam e se entendem.
Ainda assim escrevo, sempre há uma esperança de que alguém leia. Tenho vendido em
várias plataformas e vejo que existe uma minoria crescente, gente que quer precisa fugir do
lugar comum, um espaço aglomerado de idiotas. Esses dias escrevi Maria, a história real de
uma menina do sertão entregue para ser criada por uma família tradicional de São Paulo. Essa
história eu tomei conhecimento com membros de uma ocupação no sul da Bahia. Aprendi um
pouco mais.
Cada vez que leio aprendo e cada vez que escrevo aprendo mais, pois as histórias não
são minhas. Mas de uma olhada no Facebook, tente interagir com um ignorante. Entrenaquelas postagens sobre comunismo, que sequer sabem o que é, ou Paulo Freire, ou a
dignidade da ex-primeira dama. Se você consegue interagir com esses retardados, parabéns,
você está no grupo.
Escrever pra quem?
