Protestos da geração Z: Nepal, Peru e Madagascar

Nos últimos meses, temos assistido a uma onda de protestos em países como Nepal, Madagascar e, mais recentemente, o Peru. Apesar das distâncias geográficas e das diferenças culturais, essas manifestações têm muito em comum e dizem muito sobre o momento global vivido pela geração Z.

A primeira característica é o perfil dos manifestantes, formado majoritariamente por jovens da geração Z, aqueles nascidos entre 1995 e 2010.
Coincidentemente, é também o grupo que está ingressando agora no mercado de trabalho. E é justamente aí que surge a segunda convergência entre os protestos: a pauta.

Esses jovens perceberam que o mundo prometido a eles na infância — de prosperidade, estabilidade e oportunidades — não é o mesmo que encontram agora na vida adulta, em meio a um estado de bem-estar social profundamente fragilizado.
As redes sociais, que antes pareciam o espaço natural de expressão e ascensão, se transformaram no principal instrumento de organização e resistência.

Em setembro de 2025, o governo nepalês impôs um bloqueio às principais plataformas digitais, como Facebook, Instagram, YouTube e WhatsApp, sob o pretexto de exigir um novo registro das empresas. A decisão atingiu em cheio a geração Z, cuja vida cotidiana, trabalho e comunicação dependem dessas redes.
A reação foi imediata: milhares de jovens saíram às ruas de Katmandu e de outras cidades. O que começou como uma reivindicação digital rapidamente se transformou em um protesto político mais amplo, contra a corrupção, o nepotismo e a falta de oportunidades no país.

Os manifestantes usaram as mesmas redes que o governo tentou silenciar para se organizar, criar memes e espalhar mensagens e símbolos. Entre esses símbolos, ganhou força uma bandeira preta com uma caveira estilizada, uma referência direta à bandeira dos piratas de One Piece, anime japonês que marca fortemente o imaginário da geração Z.
A caveira, inspirada no personagem Monkey D. Luffy e sua tripulação, representa rebeldia, solidariedade e a busca por liberdade, valores que ressoam fortemente entre jovens que se sentem traídos por governos e elites.

Poucas semanas depois, em Madagascar, os protestos seguiram um roteiro diferente.
Tudo começou com reclamações sobre os cortes frequentes de energia elétrica e a falta de água potável em Antananarivo. As manifestações rapidamente se ampliaram, denunciando corrupção, má gestão e desigualdade. Em meio à repressão policial e à morte de ao menos 22 pessoas, o movimento ganhou uma força inesperada: unidades do exército se recusaram a reprimir os jovens e acabaram forçando uma crise política que levou à queda do presidente Andry Rajoelina.

Assim como no Nepal, os jovens de Madagascar organizaram-se principalmente pela internet e adotaram símbolos globais da cultura pop, entre eles a mesma bandeira pirata de One Piece.
A caveira, nesse contexto, não é um símbolo de destruição, mas de liberdade e resistência, uma maneira de afirmar que, se o sistema parece naufragar, os jovens preferem ser os piratas que se rebelam contra a tirania dos mares.

No Peru, as manifestações da última semana seguem o mesmo espírito.
As pautas incluem a reforma da previdência, a falta de segurança e críticas à anistia concedida este ano a militares e policiais acusados de crimes durante o combate ao Sendero Luminoso e ao Movimento Túpac Amaru, medida apoiada pelo governo de Dina Boluarte.
Mais uma vez, são os jovens, conectados, descrentes das instituições e organizados online, que tomam a dianteira.

O que une Nepal, Madagascar e Peru é mais do que a crise política.
É o sentimento global de frustração de uma geração que cresceu acreditando em progresso, tecnologia e liberdade, mas que agora se vê diante de um futuro estreito e de um Estado cada vez menos capaz de garantir estabilidade e esperança.

 

José Victor

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